quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Perdido em Marte

O astronauta Mark Watney (Matt Damon) é enviado a uma missão em Marte. Após uma severa tempestade ele é dado como morto, abandonado pelos colegas e acorda sozinho no misterioso planeta com escassos suprimentos, sem saber como reencontrar os companheiros ou retornar à Terra.







Desde que em 1877 o astrônomo Giovanni Schiaparelli observou os “canais de Marte”, a humanidade passou a prestar mais atenção nesse nosso vizinho. Por ironia do destino, sabemos hoje que Marte é o único planeta (conhecido por nós) habitado apenas por robôs (Spirit, Pathfinder e Curiosity) e agora NASA e Hollywood fazem todos os olhos se voltarem para Marte novamente.
Perdido em Marte (The Martian) de Andy Weir é provavelmente o melhor livro que li nos últimos cinco anos e, por esta qualidade reconhecida, talvez tenha sido o motivo do aclamado diretor Ridley Scott adiar seu projeto de realizar a continuação de Prometheus para adaptá-lo às telas.
O astronauta Mark Watney (Matt Damon) é enviado a uma missão em Marte. Após acidente decorrente de uma severa tempestade, ele é dado como morto. Abandonado pelos colegas, ele acorda sozinho no misterioso planeta com escassos suprimentos, sem saber ao certo com sobreviver até que uma longínqua missão de resgate aconteça.
É fácil notar na história os primórdios aventureiros de Robison Crusoé, romance clássico do escritor inglês Daniel Defoe publicado em 1719, só que em solo marciano. Fica nítida também a influência do filme baseado no acidente ocorrido com a Apollo 13, uma verdadeira jornada de heróis mostrando a trajetória da NASA – da tragédia ao triunfo. Depois que passa a novidade da exploração da Lua, só mesmo um desastre e a imprensa sensacionalista para fazer com que o público volte a interessar-se pela conquista espacial.
O grande trunfo do filme, como também aconteceu com Gravidade de Alfonso Cuarón, é ir além da mera história de sobrevivência como Mar Aberto, 127 Horas, Náufrago e tantos outros. A partir da situação hostil inicial que o astronauta se encontra, uma sequência de acontecimentos se desenrola em ótimas cenas de ação, suspense, drama e até comédia sarcástica com as inúmeras referências à cultura popular de nosso tempo e ao atual estágio de exploração de Marte.
O roteiro segue o clássico formato da jornada do herói, com um protagonista tendo um chamado à aventura a contragosto, mas enfrentando os desafios uma vez estando fora do lugar comum, tendo ainda momentos de fraqueza diante das dificuldades. No entanto, o maior pecado do filme foi exagerar nos alívios cômicos, fazendo parecer que a luta pela sobrevivência do protagonista não passasse drama suficiente para o espectador.
O audiovisual do filme é muito bem implementado, com destaque para o cenário naturalmente vermelho de Marte, ajudando a construir o background de solidão e da batalha pessoal que o protagonista estava travando para continuar vivo (lembrando que Marte é o deus da guerra na mitologia romana). Na trilha sonora temos a predominância da Disco Music funcionando muito bem como alívio cômico. Os destaques ficam para “Starman”, de David Bowie e “I Will Survive”, de Gloria Gaynor – que só pelo título já se justificam.




45 Anos - 45 Years

45 Years começa com uma boa e uma má notícia. A boa notícia é que Kate (Charlotte Rampling) e Geoff (Tom Courtenay) estão prestes a comemorar os 45 anos de união com uma nova festa. A má notícia é que a ex-namorada dele, que morreu em um acidente nos Alpes décadas atrás, teve o seu corpo encontrado no fundo de um vale nevado.

A metáfora do cadáver congelado pode ser óbvia, mas fornece uma sugestão poderosa. Como o corpo foi resfriado rapidamente, a vítima manteve a mesma aparência, as mesmas roupas, e não entrou em decomposição. Ou seja, enquanto o casal de sexagenários combate os problemas relacionados ao envelhecimento – rotina entediante, falta de sexo, problemas de saúde – a paixão de juventude é encontrada intacta, com a mesma imagem de antes.

O gelo conservou a imagem, e talvez também tenha conservado a paixão de Geoff. Poucos dias antes da alegre cerimônia, o casal atravessa uma crise sem precedentes de ciúmes e falta de confiança. Kate tenta ser pragmática e ignorar os fatos, até perceber que a memória da falecida está mais presente em sua casa do que imaginava. Com muita calma, o roteiro apresenta o passar dos dias, com letreiros na tela.

O diretor Andrew Haigh constrói momentos de grande naturalidade na vida de um casal idoso, incluindo cenas com os amigos, momentos de dança e um ato sexual. Mesmo assim, em ritmo progressivo, o cineasta consegue criar o suspense: o que vai acontecer no dia da cerimônia? Eles vão terminar o casamento? Vai dar tudo certo? Haigh economiza – até demais – na quantidade de conflitos ao longo da história, que é belamente filmada, mas um tanto inerte. Entretanto, é possível acreditar que o cineasta tenha feito essa escolha porque acreditava no potencial de sua conclusão que, de fato, é excepcional.

Sem querer estragar o prazer para o leitor, basta dizer que o final de 45 Years traz uma cena de encerramento magnífica, daquelas capazes de marcar o espectador e deixar o público colado à cadeira muito tempo após o fim da sessão. Embora Tom Courtenay tenha uma interpretação competente (fazendo um homem atrapalhado, mas amoroso), é Charlotte Rampling quem brilha.

A atriz já apresentou os seus talentos dramáticos em diversos dramas (como Sob a Areia, Em Direção ao Sul, Jovem e Bela), mas em 45 Years ela consegue se superar. O diretor cola a câmera no corpo da atriz o tempo inteiro, e na última cena, em particular, a sua atuação é assombrosa. Este momento deve ter parecido simples no roteiro, mas Rampling o transforma em uma cena incrível, tocante e assustadora ao mesmo tempo. Alguns minutos que, por si só, já valem um filme inteiro.